O que as pessoas mais longevas comem?

 Como viver melhor e por mais tempo


Apenas cerca de 20% do tempo de vida é ditado por nossos genes, enquanto os outros 80% são ditados por nosso estilo de vida1. Já é sabido que algumas dietas melhoram a saúde e previnem doenças, especialmente as cardiovasculares. Estudos mostraram que dieta vegetariana promoveu proteção contra a incidência e/ou mortalidade por doença isquêmica do coração e incidência de câncer. Ainda, vegetarianos e veganos demonstraram ter níveis reduzidos de índice de massa corporal (IMC), colesterol total, colesterol LDL e glicose em comparação aos onívoros2.

Em determinados grupos populacionais, com específicos padrões dietéticos e de estilo de vida, tem se registrado resultados de saúde contrários ao crescente aumento de doenças crônicas não transmissíveis da maioria da população. Um dos exemplos foi a ausência de hipertensão e obesidade encontrada em indígenas Yanomami, que vivem em aldeias na floresta amazônica na fronteira entre o Brasil e Venezuela. Os Índios Yanomami não tem aumento da pressão arterial com a idade, os níveis do colesterol sérico total são quase metade dos relatado nas populações brasileiras de grandes cidades ou de outros países3. Devido ao seu isolamento e à ausência de influências dietéticas ocidentais, além de não ingerirem nenhuma bebida alcoólica, a dieta dos Yanomami é pobre em gordura e sódio e rica em potássio e fibras, consistindo de itens como banana, mandioca, frutas e carne principalmente de peixes. Esse achado é importante porque uma redução de 6 mm Hg na pressão arterial sistólica pode diminuir a mortalidade por doença arterial coronariana em 10% e mortalidade por acidente vascular cerebral em 16%. E isso nos trás um guia de como podemos viver mais, e com saúde.

Outros povos do globo também tem sido exemplo em como ter uma vida longa, e eles estão localizados mais especificamente na Sardinia na Itália, Okinawa no Japão, península de Nicoya na Costa Rica e a ilha de Ikaria na Grécia, que foram definidos como blue zones (zonas azul). O termo blue zones foi dado a essas áreas onde a população compartilha um estilo de vida e ambiente semelhantes. Além de fatores ambientais como grau de poluição e qualidade da água, os fatores de estilo de vida observados nessas regiões foram: dieta, exercícios, mentalidade e relacionamentos. O que têm proporcionado não só longevidade, mas uma saudável vida, incluindo bem-estar e saúde cognitiva, com características psicológicas positivas e baixos sintomas de depressão4.

Zonas azuis: onde vivem os povos mais longevos


As populações das blue zones estão geograficamente e/ou historicamente isoladas (em ilhas e regiões montanhosas), e conseguiram manter um estilo de vida tradicional, que implica em rotineira atividade física que se estende além dos 80 anos, nível reduzido de estresse e apoio familiar e da comunidade, bem como o consumo de alimentos produzidos localmente, o que ilustra a natureza multifatorial do envelhecimento saudável.

Agora especificamente sobre o que esses povos comem, se concentram majoritariamente em alimentação baseada em plantas (grãos integrais, legumes, verduras, frutas, castanhas, tofu, azeite), esporádico consumo de peixes (2x na semana, no máximo) e praticamente nulo de carnes vermelhas5. As dietas tradicionais de Okinawa fornecem ≥90% das calorias em carboidratos (predominantemente de vegetais), que são baixos em calorias, mas nutricionalmente densos, especialmente vitaminas, minerais e fitoquímicos, enquanto a dieta mediterrânea tradicional fornece >40% das calorias de gordura monoinsaturada e poli-insaturada (proveniente de óleos vegetais e peixes)6.

Os centenários se concentram em comer o que cultivam e passar tempo de qualidade com a família. Além disso, eles praticam sua fé e têm um propósito de vida, que pode ser definido por “porque eu acordo de manhã”.

A cidade de Loma Linda no estado da Califórnia dos EUA também foi considerada uma blue zone. Os habitantes vivem até dez anos a mais do que a média dos americanos (79 anos) e chegam à idade avançada com uma saúde melhor. Com quase metade da população adepta à Igreja Adventista do Sétimo Dia, as pessoas seguem um estilo de vida protetor com dieta vegetariana (em sua maioria), exercício físico, descanso aos sábados, não fumantes e sem consumo de bebidas alcoólicas, combinados com religiosidade, espiritualidade e conexão social.

A comunidade Adventista tem sido alvo de estudos avaliando o efeito da dieta na saúde justamente por conseguir atingir uma amostragem significativa de pessoas vegetarianas ou que excluem as carnes de sua alimentação7–9. Como resultados, os padrões de dieta vegetariana foram associados a menor índice de massa corporal, menor prevalência e incidência de diabetes mellitus, menor prevalência de síndrome metabólica e de hipertensão, menor mortalidade por todas as causas e, em alguns casos, menor risco de câncer9.

Para finalizar, evidências indicam que os padrões dietéticos associados à longevidade enfatizam vegetais e frutas, e são reduzidos em gordura saturada, carnes, grãos refinados e laticínios10. Os alimentos vegetais fornecem mais antioxidantes e fitoquímicos que ajudam a combater os radicais livres, além de conter os prebióticos que as bactérias benéficas do nosso intestino precisam para se alimentar.

 

Quer saber mais? 

Recomendo a leitura do livro “The Blue Zones: Lessons for Living Longer from the People Who’ve Lived the Longest” (versão em português é “Zonas azuis: A solução para comer e viver como os povos mais saudáveis do planeta”) 

Livro: Zonas azuis: A solução para comer e viver como os povos mais saudáveis do planeta



Referências:

1.           Herskind, A. M. et al. The heritability of human longevity: A population-based study of 2872 Danish twin pairs born 1870–1900. Hum. Genet. 97, 319–323 (1996). https://doi.org/10.1007/BF02185763

2.           Dinu, M., Abbate, R., Gensini, G. F., Casini, A. & Sofi, F. Vegetarian, vegan diets and multiple health outcomes: A systematic review with meta-analysis of observational studies. Crit. Rev. Food Sci. Nutr. 57, 3640–3649 (2017). https://doi.org/10.1080/10408398.2016.1138447

3.           Mancilha-Carvalho, J. de J. & Silva, N. A. de S. e. The Yanomami indians in the INTERSALT study. Arq. Bras. Cardiol. 80, (2003). https://www.scielo.br/j/abc/a/8yHr8tMsx5hB6s3sbQZRzKC/?format=pdf&lang=en

4.           Hitchcott, P. K., Fastame, M. C. & Penna, M. P. More to Blue Zones than long life: positive psychological characteristics. Health. Risk Soc. 20, 163–181 (2018). https://doi.org/10.1080/13698575.2018.1496233

5.           Buettner, D. & Skemp, S. Blue Zones: Lessons From the World’s Longest Lived. Am. J. Lifestyle Med. 10, (2016). https://doi.org/10.1177/1559827616637066

6.           Kromhout, D. Food Consumption Patterns in the Seven Countries Study. Ann. Med. 21, 237–238 (1989). https://doi.org/10.3109/07853898909149942

7.           Fraser, G. E. & Shavlik, D. J. Risk Factors for All-Cause and Coronary Heart Disease Mortality in the Oldest-Old: The Adventist Health Study. Arch. Intern. Med. 157, 2249–2258 (1997). https://jamanetwork.com/journals/jamainternalmedicine/article-abstract/623957

8.           Orlich, M. J. et al. Vegetarian Dietary Patterns and Mortality in Adventist Health Study 2. JAMA Intern. Med. 173, 1230–1238 (2013). https://jamanetwork.com/journals/jamainternalmedicine/article-abstract/1710093

9.           Orlich, M. J. & Fraser, G. E. Vegetarian diets in the Adventist Health Study 2: a review of initial published findings. Am. J. Clin. Nutr. 100, 353S-358S (2014). https://doi.org/10.3945/ajcn.113.071233

10.        Appel, L. J. Dietary Patterns and Longevity. Circulation 118, (2008).  https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.108.788497

11. http://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/12/qual-o-segredo-da-cidade-onde-se-vive-dez-anos-mais-e-melhor.html  Acessado em: 02/07/2021.

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